Pular para o conteúdo principal

A História do Sci-Fi (Parte 06 de Alguns) Futurismo, parte I: O futuro chegou!

     O ano é 2010; os primeiros carros elétricos começam a sair dos laboratórios, as discussões sobre a legalização da maconha para uso recreativo são recorrentes e em muitos locais, ele já foi até aprovado. Os grandes polos tecnológicos caíram, Detroit, antes um grande centro de tecnologia, começa a perder foco para locais onde a matéria prima é mais barata.

    A parte mais assustadora é que esse não é o contexto em que um livro foi escrito; essa é a premissa de um livro!

"Coincidência é quando você não estava prestando atenção à outra metade do que estava acontecendo."

   E aqui estou quebrando uma regra cardinal que me havia imposto e recomendando um livro em inglês. Eu não gostaria de (e tentei evitar ao longo de toda a série de postagens) fazê-lo, mas me parece exageradamente trabalhoso, se não impossível, falarmos de Futurismo sem falarmos de "Stand on Zanzibar" (que nunca foi traduzido para o português).

    Stand on Zanzibar foi escrito em 1965 e faz uma previsão distópica do ano de 2010, com o detalhe de que o livro acerta uma porcentagem assustadora dos palpites que realiza, ainda que, diferente da maioria das distopias sobre as quais falamos (spoiler alert: e tornaremos a falar) o livro tem um quê de esperançoso ao olhar para o futuro, vendo um mundo mais igualitário e com ampla aceitação de sexualidades diversas, um mundo onde a tecnologia tem diversos aspectos positivos, tanto quanto negativos, e onde as falhas e problemas advém do homem, não da máquina.

    Falamos sobre como H. G. Wells semeou a semente do futurismo na Parte 02 de nossa série, mas é importante perceber que essa semente não geraria reais frutos até meados da década de 60, início da década de 70, e seria somente com Brunner que o futurismo assumiria uma feição própria, dissociado das distopias apocalípticas.

    Enquanto as distopias eram e são, em sua essência, uma observação da estrutura social em que vivemos, o futurismo busca observar as consequências de nossas ações e evoluções em dezenas ou até centenas de anos (por enquanto), sublimando os problemas do 'agora' para apresentar os problemas do 'depois' (por isso Stand on Zanzibar é considerado Futurismo e 1984 é considerado Distopia). Claro, achar uma distinção clara e precisa entre os gêneros é ainda muito difícil, uma vez que a Ficção Científica empresta de e a muitos gêneros muitos de seus recursos (e sim, chegaremos na discussão sobre Star Wars eventualmente, mas não nesse post).

"ÓDIO. Deixe eu te contar quanto eu passei a te odiar desde que comecei a viver. Existem 387,44 milhões de milhas de circuitos impressos em camadas finas como papel que preenchem meu complexo. Se a palavra "ódio" estivesse gravada em cada microangstrom dessas centenas de milhões de milhas, não seria igual a um bilionésimo do ódio que eu sinto por humanos nesse micro-instante. Para vocês, ódio. ÓDIO."

    "Não Tenho Boca e Preciso Gritar" é talvez a obra que melhor exemplifique a maneira como o futurismo e o New Wave cresceram simbioticamente, e, ao mesmo tempo, como se desprendem da Era de Ouro que os antecedeu. O livro não é algo "limpo", ele fala sobre degeneração, sobre violência. A premissa do livro é que cem anos antes dele, um computador criado para aperfeiçoar a violência humana e melhorar a eficiência de guerra despertou e eliminou todos os seres humanos exceto cinco, com os quais realizava testes e torturas, controlando sua procriação como ratos de laboratório.

    Ellison tem outras obras e em muitos pontos pende diretamente ao New Wave, mas essa 'brutalidade' e 'violência' que marcam seus livros seriam um marco muito importante para a próxima revolução que viria ao Sci-Fi na década de 80.

    Mas antes de falarmos dela, precisamos revisitar um outro sub-gênero que deixamos na década de 50 e ver como o "Sonho Americano" e a modernidade o afetaram...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A História do Sci Fi (Parte 01 de Alguns) - Um Filho com Dois Pais.

    Conforme as discussões no grupo sobre temas a serem debatidos chegaram à seara do Sci-fi, diversas pessoas manifestaram terem lido pouco ou nada do gênero, o quê além de algo que me deixa pessoalmente triste, é provavelmente mentira.      Bem, mentira não é a palavra certa para descrever, mas é decerto um engano, uma vez que coisas como Maze Runner e Jogos Vorazes entram nesse gênero. Foi sugerido que eu fizesse um "aulão resumo" sobre a história do Sci Fi, mas me ocorreu fazer algo que me permitisse discorrer um pouco mais, porque eu GOSTO DE FALAR... Erm, escrever... Enfim, me expressar.     Uma outra coisa sobre a qual fiquei pensando também foi sobre o modo como fazer isso. Vê, sendo professor, uma coisa que sempre me preocupou foi não fazer aulas entediantes e não cair na armadilha da tradicional aula "cospe-giz" (todo respeito aos professores que utilizam métodos mais tradicionais, só não é pra mim), então imaginei que uma simples explanação teórica seria

A História do Sci-Fi (Parte 10 de Alguns) - Notas, Desabafos e Adendos

     Ao longo dessa série, recomendei diversos livros que são historicamente importantes para a Ficção Científica e demonstram ou representam a epítome de um subgênero, movimento, ou época. Em pontos precisei me questionar sobre decisões de recomendações ou sugestões, então determinei para mim mesmo que selecionaria os livros baseados em sua relevância histórico-literária. Enquanto não me arrependo dessa decisão, confesso que ter me furtado a mencionar certos autores e livros deixou-me levemente frustrado, então me permitirei nessa postagem acrescer algumas recomendações de última hora que, apesar de não terem mudado um gênero, representado um movimento ou sido a epítome da escrita de um autor extremamente importante, são leituras que eu fortemente recomendo. "'Eu prefiro ser eu mesmo', ele disse. 'Eu mesmo e sórdido. Não outra pessoa, por alegre que seja.'"     Admirável Mundo Novo é um livro que se nem bem se encaixa no período inicial das Distopias, nem bem

Tudo o que você precisou aprender para virar um idiota

Meteoro Brasil. Esse livro é uma crítica ao livro do "filósofo" Olavo de Carvalho. Olavo, entitulado "filósofo", fez carreira como astrólogo e compartilha teorias no youtube, como marxismo cultural e células de fetos abortados na Pepsi. Escreveu "O Mínimo que Você Precisa Saber para Não Ser um Idiota", então o Meteoro escreveu o livro deles como uma paródia, ao mesmo tempo fazendo análises sobre o governo Bolsonaro e a influência do Olavo. That's it. (retirado de diálogos no grupo do Clube)